Sapinho-pingo-de-ouro Brachycephalus ephippium (Spix, 1824)
Ordem: Anura | Família: Brachycephalidae | Gênero: Brachycephalus
Indivíduo adulto de Brachycephalus ephippium. Serra do Japi - SP, Agosto de 2018
Foto: Victor Fávaro Augusto
O gênero Brachycephalus é endêmico da Mata Atlântica brasileira, entre os Estados Bahia e Paraná (POMBAL et aI. 1998), sendo a espécie Brachycephalus ephippium distribuída entre os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. O número de espécies reconhecidas tem aumentado muito nos últimos anos. Logo, é esperado que novas espécies deste gênero sejam descobertas.
Descrição:
Brachycephalus ephippium é um anuro de pequeno porte, no qual indivíduos adultos podem variar de 12,5 mm a 19,7 mm de comprimento. Embora pequeno, possui um corpo robusto com pernas curtas. A cor da pele é amarela brilhante a laranja. A íris é completamente preta. O número de dígitos é reduzido, com três dedos e três dedos funcionais. As falanges também são reduzidas, tanto em número quanto em tamanho, de modo que os dedos das mãos e pés são mais curtos e menores. As falanges terminais são em forma de T. Um escudo ósseo dérmico está presente e ossificado dorsalmente à coluna vertebral. Não há dentes na mandíbula ou na pré-mandíbula. (Pombal, 2003).
Os indivíduos de B. ephippium apresentam um certo contraste com o meio, devido à sua coloração alaranjada, porém podem se camuflar entre folhas, sementes, frutos e fungos com cores semelhantes à sua. Portanto, a cor alaranjada da pele dessa espécie pode ser críptica ou disruptiva, dependendo do ambiente em que se encontra. No entanto, há evidências que a sua principal defesa é o aposematismo (HADDAD; SAZIMA, 1992; SEBBEN et al., 1986; HANIFIN, 2010) e a sua cor vívida também pode estar relacionada com comunicação visual intra-específica (entre indivíduos da mesma espécie).
Habitat
Áreas florestadas
Sítio de canto/ Calling site
Chão de mata
Atividade
Diurno
Venenoso/Toxic
Sim
Hábito
Criptozóico
Endemismo
Mata-atlântica
Distribuição-geográfica:
Status: Segura ou pouco preocupante ou Least Concern, em inglês (LC)
Vocalização - (gravado por: Autor desconhecido)
Reprodução:
O desenvolvimento larvário em anfíbios anuros geralmente ocorre em ambientes aquáticos, embora possa ocorrer em outros ambientes, como é o caso das espécies da família Brachycephalidae que vivem na serapilheira da floresta, cuja umidade é elevada, possibilitando ter ovos grandes com muita grande quantidade de vitelo e desenvolvimento direto (LUTZ 1949).
O macho de Brachycephalus ephippium, no momento da desova, muda a posição do amplexo, segurando a fêmea na região mediana do abdômen. Esta mudança de posição permite que a cloaca do macho fique mais próxima a da fêmea, provavelmente aumentando a eficiência de fertilização dos ovos, durante a oviposição.
Logo após a oviposição, a fêmea apresenta um comportamento especializado e estereotipado, onde mantém um amplo contato com os ovos. Este comportamento tem visivelmente como consequência, grande aderência de partículas do substrato aos ovos, resultando em uma camuflagem eficiente. Provavelmente estas partículas também ajudem na manutenção da umidade dos ovos. Algumas das secreções da pele de anfíbios podem ter função bactericida e fungicida, sendo possível que o contato prolongado da fêmea de B. ephippium com os ovos transfira algumas destas substâncias, atenuando as infestações por fungos frequentes em desovas terrestres (L YNN & LUTZ 1946a,b; IZECKSOHN el aI. 1971).
B. ephippium apresenta menor número de ovos por desova e diâmetro do ovo maior quando comparado a outras espécies de desenvolvimento direto (DUELLMAN & TRUEB 1986). O aumento no tamanho dos ovos está relacionado à diminuição do seu número. Desta forma, B. ephippium estaria investindo no maior tamanho dos ovos, em detrimento do número. O embrião se desenvolvendo em cerca de 60 dias.
O desenvolvimento fora do meio aquático pode diminuir as pressões de predação e competição, postula-se que a predação é a principal pressão a determinar a evolução de desovas não aquáticas em anuros.
Inicialmente a presença de um dente de ovo era conhecida apenas em embriões de anuros com desenvolvimento direto do gênero Ischnocnema, porém, logo foi descoberto que B. ephippium também possuía um dente de ovo, no qual é reduzido e ausente no indivíduo jovem desta espécie com menos de doze horas de vida, o que permite supor que o dente desprende-se logo após a eclosão.
A coloração dos jovens recém-eclodidos (menos de 12 horas após o nascimento) é castanho-avermelhado. A cabeça é pouco mais escura que o dorso e o abdômen castanho-amarelado que, devido a translucidez da pele, permite visualizar o vitelo.
(3) embrião com 25 dias de desenvolvimento; (4) embrião com 45 dias de desenvolvimento; (5) jovem recém-eclodido; (6) macho adulto.
Fotos: Revista bras. Zool. 16 (4): 967 - 976,1999
Distribuição geográfica:
A espécie Brachycephalus ephippium ocorre nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, em altitudes entre 750 e 1200 m.
Habitat e Comportamento:
É uma espécie diurna, habita entre a serapilheira da Mata Atlântica, sendo ativa principalmente em dias de alta umidade.
O ambiente preferencial da espécie pode ser caracterizado por apresentar serapilheira e solo muito úmidos e com temperaturas amenas (entre 19 e 21ºC); corpos d’água próximos que lhes conferiam mais umidade (preferência por ambientes com umidade relativa do ar superior a 85%); serapilheira heterogênea formada por folhas, galhos, sementes, troncos podres e frutos; pedras cobertas por musgos; árvores de grande porte; sub-bosque expressivo; muitas plântulas; raízes grandes formando abrigos; tapetes de raízes; dossel relativamente fechado, mas com luz chegando ao solo. Altas temperaturas podem atuar na evaporação da água contida na serapilheira e na pele do anuro, enquanto temperaturas muito baixas podem diminuir o metabolismo do animal (WELLS, 2007), fazendo com que esse reduza a sua exposição e atividade.
Apesar dos indivíduos de B. ephippium apresentarem movimentos lentos, são capazes de realizar saltos rápidos de até 20 cm de distância (cerca de 10 vezes o seu CRC - comprimento rostro-cloacal), se sentirem-se ameaçados, além de também abrirem a boca quando se sentirem acuados.
Inclusive, apresentam comportamento de tanatose, no qual deixam a região ventral exposta, a região dorsal em contato com o chão, os membros próximos ao corpo e os olhos abertos. O predador pode perder o interesse na presa aparentemente morta ou, ao ficar imóvel, a presa pode evitar maiores ferimentos quando ingerida pelo predador e ser regurgitada por ser impalatável ou tóxica, escapando com vida (TOLEDO et al., 2011).
Curiosidade:
A fluorescência é um fenômeno bem conhecido em organismos marinhos, porém recentemente foi descoberto em vertebrados terrestres este mesmo fenômeno; o primeiro relatório de fluorescência em anfíbios foi descrito nas glândulas linfáticas e cutâneas das espécies Boana punctata e B. atlantica (Taboada et al. 2017). Goutte et al. (2019) relata outro caso de fluorescência em anfíbios: desta vez nos ossos dérmicos de duas espécies de sapinhos-pingo-de-ouro, Brachycephalus ephippium e B. pitanga. Quando expostos à intensa luz UV, eles descobriram que a intensidade da fluorescência aumenta com a maturidade do sapo, à medida que a camada epitelial co-ossifica com os ossos da cabeça e das costas. Dadas as conclusões anteriores (Goutte et al. 2017) de que essas duas espécies eram incapazes de ouvir suas próprias chamadas de propaganda e, em vez disso, se baseavam em pistas visuais, como acenar com as mãos e abrir a boca para acasalar, eles hipotetizam que a fluorescência nessas espécies pode ser utilizado para melhorar a comunicação visual intraespecífica. No entanto, é necessária uma análise da visão de Brachycephalus para testar esta hipótese, e uma hipótese alternativa é que a fluorescência aprimora avisos aposemáticos da toxicidade dos sapos para predadores que vêem fluorescência na luz natural, como pássaros e aranhas.
Página editada por: Beatriz Pique em jun/2020.
Referências:
POLETTINI-NETO, A. 2013. A influência de variáveis ambientais na distribuição e abundância de Brachycephalus ephippium na Serra do Japí, Jundiaí, São Paulo. Trabalho de Conclusão de Curso, Ciências Biológicas, UNESP Campus de Rio Claro/SP. 597.8 P765i.
POMBAL Jr., J. P. Oviposição e desenvolvimento de Brachycephalus ephippium (Spix) (Anura, Brachycephalidae). Revista bras. Zool. 16 (4): 967 - 976,1999.
AmphibiaWeb. 2020. <http://amphibiaweb.org> University of California, Berkeley, CA, USA. Acesso em 28 junho de 2020.
POMBAL Jr., J. P. & IZECKSOHN, E. Uma nova espécie de Brachycephalus (Anura, Brachycephalidae) do estado do Rio de Janeiro. São Paulo: Pap. Avulsos Zool., v. 1.51, n.28, 2011.